quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Agostinho da Silva

Recordo que tomei conhecimento de Agostinho da Silva em inícios de 1990; eu e a maior parte dos seus, os portugueses. Foi através da televisão, numa série de conversas apaixonantes com algumas figuras nacionais, sobretudo do jornalismo. A série de treze programas tinha o título de «Conversas Vadias» e passava na RTP, antes ainda da televisão privada.
Recordo-o como uma figura fascinante, alguém que sem compromissos escolásticos, sem partido ou igreja, era simplesmente Agostinho da Silva, o homem que vivia com os gatos sem nome e assumia a liberdade como a grande faculdade humana.
Após a sua morte, reencontrei Agostinho da Silva num pequeno livro prefaciado por Eduardo Lourenço, intitulado «A Última Conversa», uma entrevista com o velho Professor conduzida por Luís Machado. O mesmo fascínio da televisão para saborear na tranquilidade e no silêncio da leitura.
Na universidade reencontrei o legado de Agostinho da Silva e jamais poderei esquecer, para a “gramática da Ciência Política”, esta conceptualização tão emblemática do seu pensamento:
«A fonte do Poder não é, para portugueses, nem delegação de transcendências, nem figuração de imanências, nem contrato ou consenso; a fonte do poder é a unidade essencial do homem, da paisagem e do sonho que numa e noutra anda; o poder emana das aldeias no curtido das faces, na aspereza das rochas, no fumo das lareiras, no mugido dos gados, no escampado do horizonte, na imobilidade e no gesto, no silêncio e na palavra».
Era tudo isto que o tornava impar. Porque George Agostinho Baptista da Silva, nascido em Campanhã, Porto, a 13 de Fevereiro de 1906, acreditava que a existência só fazia sentido quando vivida na «liberdade de se ser plenamente aquilo que se é».
Cem anos depois do seu nascimento, voltamos a ele. Em boa hora, diga-se. E eu lá retirei do pó das prateleiras a «Reflexão», para ali saltitar folha ante folha antes de dormir e pensar no quanto desejamos, como indivíduos e como povo, ser profundamente livres – na verdade, é esse mesmo o sentido da história; o nosso, enquanto portugueses, e o dos outros.