terça-feira, março 28, 2006

Porque há que...

...Violentar o Sistema!
NOite CerrADA

O sol pôs-se devagar. Foi num momento de hiato dos ruídos e dos vultos que só na aparência estão iluminados. De dia, assim parecem. Na penumbra, as suas formas são cognoscíveis, perceptíveis da sua própria identidade. Sabem sem saber que vivem na noite cerrada, para lá da luz intensa que, julgam os pobres, os ilumina. Sabem que é tudo uma questão de tempo, que a morte espreita para além de uma noite ou de um dia. Noite cerrada, a que vivemos, como se fosse a ilusão do sol que nos guia para lado nenhum. Pode ser que um dia acorde o espaço e o tempo, surja o sol e morra a lua destas vistas extenuadas pelos ritmos e os compassos sem pausa das vidas estupidamente sofisticadas e modernas que por aqui (onde?) pairam. Na noite cerrada, sem dia. Venha o dia, parta a noite lálálálá; trauteando a canção caminha a turba no escuro. Apalpa no bolso as notas de euro, garante que tem o cartão visa bem resguardado entre o corpo perfumado e a roupa importada. Nada falha na penumbra iluminada. (Silêncio).................................... – murmuro: Quero o que todos querem............ Uma pausa! Mas não, o mundo não pára. Canta a mulher que perdeu os filhos na noite cerrada: Venha o dia parta a noite lálálálá. Trauteiam agora, todos mesmo todos, a canção. Bem alto, marialvas de shopping center e imitadores do mundo novo. A chave do Mercedes no bolso do senhor que até é doutor, ou talvez engenheiro, ou quiçá arquitecto de profissão. Mas que bem estamos na vida! Não me lembro quem sou ou o que faço aqui, quem tenho, quem amei ou quem me ama, se ainda somos passíveis de amar... Pobre homem, tão rico com a boca a saber a cona oxigenada de secretária que tem de ganhar a vida. Pobre homem rico que subjuga, que aldraba, que maltrata, que oprime... QUE É CEGO! Pois bem, a excelência nada vê ou não quer ver, que se dane, esse títere de merda. Hás-de pagá-las quando o teu carro explodir ou quando apanhares sida ou outra merda qualquer. Que se fodam todos. A mim não me exploram mais, não me voltam a enrabar que eu não deixo... Liberdade! Liberdade! Caí a lágrima devagar. Não se vê, tudo é escuro, treva, tudo oculto na penumbra. Vida real. Noite cerrada. Sem luar, sem hollywood, sem ponta por onde pegar.
Trauteando lálálálá venha o dia parta a noite lálálálá. Move a turba, move a turba.

sábado, março 18, 2006

20 Anos depois de Borges (4)

A Luís de Camões (1960)
Sem cólera nem mágoa arromba o tempo
As heróicas espadas. Pobre e Triste,
À nostálgica pátria regrediste
Pra com ela morrer nesse momento,
O capitão, no mágico deserto.
Tinha-se a flor de Portugal perdido
E o áspero espanhol, antes vencido,
Ameaçava o seu costado aberto.
Quero saber se aquém da derradeira
Margem compreendeste humildemente
Que o império perdido, o Ocidente
E o Oriente, o aço e a bandeira,
Perduraria (alheio a toda a humana
Mudança) em tua Eneida lusitana.
Jorge Luis Borges

segunda-feira, março 13, 2006

Frida Kahlo

Imperdível! No Centro Cultural de Belém até 21 de Maio de 2006.

quarta-feira, março 08, 2006

Todos Os Dias

Porque as mulheres sempre foram, e serão, as protagonistas do filme da minha vida.

terça-feira, março 07, 2006

20 Anos depois de Borges (3)

O LABIRINTO (1984)

É este o labirinto de Creta. É este o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro. É este o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja pedra se perdem tantas gerações. É este o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja pedra se perdem tantas gerações, como Maria Kodama e eu nos perdemos. É este o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja pedra se perdem tantas gerações, como Maria Kodema e eu nos perdemos naquela manhã e continuamos perdidos no tempo, esse outro labirinto.
Jorge Luis Borges

domingo, março 05, 2006

A Linguagem dos Amantes

Que língua falam os amantes,
que não consigo entender.
A linguagem dos corpos sobre a cama,
nessa nave imensa dos desejos, dos prazeres, dos sussurros e dos silêncios
da linguagem táctil dos amantes.

Estou frio,
tão surdo e confuso, que o som me trespassa
como um punhal perfurante num corpo embriagado.
Gravo no meu cérebro as dúvidas imensas do momento,
do tempo e da incerteza, da dúvida ou da regra que é lei natural.

Que língua falo eu como amante,
que não consigo entender.
Enlaço-me contigo na cama, penetro o teu corpo,
Envolvo-me no contacto das nossas peles,
e pergunto-me porque códigos se tece a linguagem dos amantes.

Estou quente,
quase febril, e com os sentidos alerta, eis que surge uma nova dor.
A dor de tanto amar e de tanto desejar que o momento não cesse.
E dentro de mim, escondo o teu cheiro e aquilo que decifrei
do código que tece a linguagem dos amantes.

1998

quinta-feira, março 02, 2006

My Wild Love

Deu-me a nostalgia, a vontade de recuar e viajar pelos tempos das dunas abandonadas em tardes solarengas de inverno. Senti a vertigem de lá voltar... E, vezes sem conta, pus a tocar «My Wild Love».

My wild love went riding, she rode all the day
She rode to the devil, and asked him to pay.
The devil was wiser, it´s time to repent
He asked her to give back the money he spent.
My wild love went riding, she rode to the sea
She gathered together some shells for her hair.
She rode on to Christmas, she rode to the farm
She rode to Japan and re-entered a town.
My wild love is crazy, she screams like a bird
She moans like a cat when she wants to be heard.
Jim Morrison (1969)