Um Filme: ALICE
Cento e noventa e três dias passaram sobre o desaparecimento da pequena Alice. O pai, Mário, cumpre um ritual peculiar: recolher e substituir as dezenas de cassetes vídeo que captam imagens das ruas de Lisboa através de inúmeras câmaras previamente colocadas em casas de amigos, lojas ou terraços. Ao invés da mulher, destroçada pela perda e rendida aos factos, Mário crê piamente no seu plano porque, como diz, um dia a filha irá passar por aí e ele «estará lá». A omnipresença buscada num ritual de esperança e dor vai esbatendo na indiferença dos outros e no que soçobra da vida sem Alice, e Mário acaba abandonado à evidência de nunca mais recuperar a filha.
Em termos formais, «Alice» é um filme muito próximo de outra obra maior do cinema português, «Ossos» de Pedro Costa, pelo seu realismo, pelos seus silêncios, pela sua amargura e pela sua estrutura estética. Para lá do drama vivido pelas personagens, há em ambos uma crítica social feroz à indiferença e à desumanização das cidades. Em «Ossos» era o bairro de lata nos arrabaldes da metrópole; em «Alice» é a própria cidade e a sua malha urbana. A Lisboa branca dos bilhetes-postais nega-se numa cidade sempre fria, escura e chuvosa, mergulhada numa luz ténue, azulada e decrépita. Os rostos da urbe são uma negação profunda de identidade e solidariedade, surgindo tão padronizados na sua indiferença quanto o ritual inconsequente e constante em que se desenvolve o personagem principal durante todo o filme.
O que mais sobressai em «Alice» é essa visão hiper realista, carregada de gente dentro numa Lisboa urbana, opressora e absurdamente desumanizada. A cidade que é metrópole e olha de soslaio para a dor e o desespero de quem por lá está ou passa. Cidade, que aqui se chama Lisboa; cidade que somos todos nós, dia-a-dia, na nossa absurda e solitária rotina.
Em termos formais, «Alice» é um filme muito próximo de outra obra maior do cinema português, «Ossos» de Pedro Costa, pelo seu realismo, pelos seus silêncios, pela sua amargura e pela sua estrutura estética. Para lá do drama vivido pelas personagens, há em ambos uma crítica social feroz à indiferença e à desumanização das cidades. Em «Ossos» era o bairro de lata nos arrabaldes da metrópole; em «Alice» é a própria cidade e a sua malha urbana. A Lisboa branca dos bilhetes-postais nega-se numa cidade sempre fria, escura e chuvosa, mergulhada numa luz ténue, azulada e decrépita. Os rostos da urbe são uma negação profunda de identidade e solidariedade, surgindo tão padronizados na sua indiferença quanto o ritual inconsequente e constante em que se desenvolve o personagem principal durante todo o filme.
O que mais sobressai em «Alice» é essa visão hiper realista, carregada de gente dentro numa Lisboa urbana, opressora e absurdamente desumanizada. A cidade que é metrópole e olha de soslaio para a dor e o desespero de quem por lá está ou passa. Cidade, que aqui se chama Lisboa; cidade que somos todos nós, dia-a-dia, na nossa absurda e solitária rotina.
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